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Cinco Cuidados Jurídicos para vendedores no Comércio pela Internet (E-Commerce)

por Edmilson Almeida[1]

A compra e venda de objetos é uma das atividades lucrativas mais antigas que se tem notícia e muito já foi e tem sido escrito sobre os seus reflexos jurídicos. Entretanto, a forma como as relações são estabelecidas pela internet altera alguns aspectos comerciais, ao ponto de antigos institutos do Direito Empresarial precisarem ser revistos. O e-commerce, que cresce e se desenvolve criativamente a cada ano, precisa ter um olhar especial dos intérpretes da lei.

Tudo isto fica muito claro por meio do acórdão da 37ª câmara de Direito Privado do TJ/SP[2], que decidiu acerca de uma transação comercial online mal sucedida: o fornecedor tinha uma conta no MercadoLivre e, contra a política desta empresa, negociou a venda do produto com o comprador fora da plataforma de venda, mas não recebeu o dinheiro e buscou a responsabilização do site por falha na prestação de serviços. O pedido foi negado e a plataforma de e-commerce, livre de qualquer responsabilidade.

Diante disto, trazemos cinco cuidados jurídicos que o fornecedor online de mercadorias precisa ter ao realizar comércio pela internet (e-commerce), especialmente aqueles do tipo C2C (Consumer to Consumer), que permite uma plataforma de intermediação da troca:

  1. CONHEÇA E CUMPRA AS REGRAS DE USO DA PLATAFORMA DIGITAL

Ao utilizar tais serviços para conceder visualização aos seus produtos e diminuir custos de manutenção de site, como OLX, Mercado Livre e o Ebay, é praxe que você seja obrigado a subscrever alguns documentos, como termos e autorizações de uso e política de privacidade, que a empresa impõe, para a melhor prestação dos serviços e relação entre os envolvidos. É nestes documentos que estão fixadas as obrigações de cada parte.

Todavia, é bastante comum que os usuários confirmem concordar com tais imposições sem, ao menos, terem lido o primeiro parágrafo. Isso traz sérios problemas, pois são tais obrigações, livre e voluntariamente aceitas, que irão vincular todas as práticas e responsabilidades das partes. A princípio, caso não haja qualquer especificidade detectada por algum juristas, se o usuário descumprir tais regras, ele estará desprotegido e facilmente será responsabilizado por qualquer conduta danosa.

Assim, é aconselhável que o usuário se cadastre naquela plataforma digital cujas políticas são mais afins com a sua proposta, pois isto é também o que diferencia as várias que tem no mercado.

  1. FAÇA PROVA DAS TRANSAÇÕES REALIZADAS

Qualquer prova, desde que obtida licitamente, pode ser um meio para reforçar a veracidade do que você alegar: prints de conversa por aplicativos de mensagens, imprimir a sequência de e-mails, gravações de operações feitas pelo computador, histórico ou extrato de movimentações na conta do usuário, logs e backups de sistemas, dentre outras opções.

No caso supracitado, o usuário alegou ter como prova que a operação mal-sucedida havia sido aprovada pelo Mercado Livre por meio de um e-mail enviado por esta empresa confirmando o pagamento da venda; somente por conta disto, o fornecedor enviou o produto. Ocorre que o acórdão afirma que “não há prova da participação do ‘MercadoLivre’ no envio do e-mail de fls. 37, o qual corroborou a conclusão da compra...”, mas havia outras provas de que o sistema da plataforma não contabilizou tal operação.

  1. LEMBRE-SE DE QUE VOCÊ NÃO É UM CONSUMIDOR

Inobstante tais empresas sejam tidas como do tipo do tipo C2C (Consumidor para Consumidor), é patente na jurisprudência brasileira que nem todo usuário que vende bens por meio de tais plataformas são considerados simples consumidores. Na verdade, com a plataforma digital, salvo situações específicas, analisadas particularmente, há um vínculo empresarial; e com o consumidor final, o usuário é fornecedor e está no lado oposto dos privilégios da legislação consumerista.

Assim, é necessário precaver-se e adiantar-se. Para tanto, é recomendado um conhecimento técnico específico dos meandros da legislação, aplicada ao contexto do e-commerce, para que tais regras sejam relativizadas em favor do usuário/fornecedor.

  1. RESPEITE AS LEIS BRASILEIRAS JÁ ESTABELECIDAS (tributário, trabalhista, consumidor, etc).

O direito é reconhecidamente um fenômeno mais lento e ainda está se adaptando às relações jurídicas atuais, construídas e vinculadas à inovação – especialmente, aquela de cunho tecnológico, que se propaga e altera e velocidades absurdas. Assim, há muitas situações ainda sem regulação, com decisões judiciais e administrativas instáveis, mas outras podem e são resolvidas com base em institutos já consolidados.

No caso supracitado, a questão controvertida era de mera responsabilidade civil, para averiguar se a operação danosa decorreu por culpa exclusiva do usuário do site (fornecedor do produto) ou de falha no algoritmo e no serviço do Mercado Livre. Este é um desafio interpretativo ordinário e com entendimento já estável na doutrina, que pôde ser aplicado ao desafio do e-commerce.  Assim, não é porque seu negócio é inovador que as leis e os entendimentos jurídicos não podem (e certamente serão!) aplicados a você.

  1. TENHA CUIDADO COM OS DADOS PESSOAIS

Embora a proteção de dados pessoais no Brasil não seja aplicada apenas ao tratamento virtual ou digital, foi com a difusão do computador e da internet e a facilidade de alterar e replicar tais dados, que estas preocupações vieram à tona com força. Portanto, a Lei Geral de Proteção de Dados aplica-se ao e-commerce e traz orientações como a impossibilidade de compartilhar com terceiros dados dos seus clientes, funcionários e parceiros comerciais, sem que estes tenham dado consentimento livre, prévio e informado. Esta norma, que entre em vigor neste ano (2020), já está revolucionando os processos comerciais e traz sanções pesadíssimas, que podem chegar ao fechamento das atividades.

Por fim, existem outros tantos conselhos que poderiam ser dados, mas estes são alguns importantes que precisam ser observados de início, em um bom planejamento empresarial, independente do porte do usuário/fornecedor. Assim, recomendamos que, caso tenha interesse em e-commerce, atividade atual e bastante lucrativa, procure um advogado de sua confiança e com a habilitação necessária para que lhe forneça todas as orientações necessárias.

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[1] Advogado Sênior. Coordenador Jurídico da SS Advocacia, Consultoria e Assessoria Jurídica e responsável pelo Núcleo Técnico-Jurídico de Direito Digital e Inovação da firma.

[2] https://m.migalhas.com.br/quentes/317878/mercadolivre-nao-indenizara-por-venda-fora-da-plataforma